quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Experiências


São as experiências que trazem amadurecimento e uma nova perspectiva sobre os fatos e situações corriqueiras, amadurecer é saber lidar com as decisões tomadas.

As experiências pelas quais passo são uma excelente fonte de textos. Todos os textos publicados neste blog carregam uma experiência pessoal pela qual passei. Por se tratarem de situações carregadas de sentimentos, desde o começo tinha em mente que registraria essas experiências pra tê-las como um diário e relembrar muitas dessas situações, sem descartar o objetivo de compartilhá-las.

O período de junho a agosto deixou de me trazer experiências gratificantes, merecedoras de uma página no diário, pois Eu estava me sentindo extremamente insegura pra poder enfrentar o mundo.  Resultado, estava fazendo tudo, ainda vestido de menino e tudo isso por puro medo da reação alheia, até que, mais uma vez, caiu a ficha de que não me privaria de viver minha vida, frequentar um curso, ir ao supermercado, correr - amo -, falar com as pessoas, enfim, fazer as coisas que qualquer pessoa normal faz.

De repente me sinto tão segura de mim, novamente, que vou onde tenho vontade de ir, claro, procurando de todas as maneiras preservar minha integridade física, psicológica e emocional. Viver é um exercício diário e todas as manhãs desperto feliz por mais um dia em que tenho a oportunidade de ser Eu mesma, de poder fazer o melhor mais uma vez, de poder aprender e ensinar e principalmente, filtrar/decidir aquilo que me atinge e aquilo que já não possui mais qualquer tipo de influência no meu emocional, como risinhos, cutucadas, etc.

Então a partir dessa semana, me permito mais uma vez viver velhas e novas experiências, me descobrir e redescobrir, me reinventar e deixar de lado tudo aquilo que não interfere em minha vida e que não me traz qualquer tipo de preocupação. É ótimo compartilhar estas experiências, pois é uma forma de aprendizado, amadurecimento, preparação para as situações vindouras e uma forma de extravasar toda essa felicidade que parece ter chegado de uma vez só.

Na eloquência da minha mente, frases vêm e vão numa velocidade assustadora e uma delas ficou de modo permanente, "se você quer um resultado diferente, faça algo diferente", porque é tão fácil se acomodar e chegar ao final do dia com o mesmo resultado dos outros tantos que ficaram pra trás, sem ter uma nova história pra contar, e uma das coisas que mais quero é continuar tendo histórias a compartilhar.

Quando o despertador tocar será uma nova oportunidade de fazer tudo diferente, mais uma vez.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

O caminho - parte I


Para alcançar um objetivo, é preciso renunciar temporariamente a certos prazeres, suportar a dor mais intensa. Só quem não desiste chega ao fim e a recompensa é demasiadamente gratificante.

O início da transição, talvez, seja a parte mais difícil de conviver. Aceitar o fato de que tenho incongruência de gênero e lidar com esse fato, me tomou um tempo e energia enormes. Dar o primeiro passo é difícil quando você está na zona de conforto, aparentemente está tudo bem, mas no meu interior ainda não estava pacificada minha decisão. O medo do desconhecido - nem tão desconhecido assim, pois sabemos ao que estamos sujeitas - me fez repetir um cotidiano massante por anos.

Quando dei meu primeiro passo rumo à transição, ainda havia muito medo do que poderia acontecer. Antes mesmo de ter em mãos a receita médica com a dieta hormonal, precisaria ter alguma certeza, por mais remota que fosse, de que Eu poderia me adaptar às mudanças radicais que passariam a fazer parte da minha vida. Foi quando em dezembro de 2011, sai de casa pela primeira vez vestida de acordo com o gênero com o qual me identifico, maquiada, perfurmada. Quando você está acostumada a ficar somente em casa, os primeiros raios de luz te trazem um medo tamanho que foram capazes de me paralisar por uns bons 10 minutos. Era um conflito interno gigantesco, vai, não vai, vai logo, não, não vai.

Se em algum momento do passado havia dúvidas quanto a transição, em todo o tempo que passei me arrumando até a hora de virar abóbora, Eu tive a mais plena certeza de que, daquele momento em diante, meu futuro reservaria uma vida plena e feliz, bastava colocar os pés fora de casa e enfrentar o mundo. Foi o que fiz. Era uma escolha e haveria consequências, algumas conhecidas, outras não.

Em janeiro de 2012 com a receita médica em mãos, uma nova vida estava começando timidamente. Muitas vezes queria que a transição se passasse como nos vídeos que costumava ver no Youtube, uma transição em 7 ou 8 minutos. É preciso ter paciência, aprender a lidar com a angústias, frustrações, pois não tem como controlar os efeitos e as mudanças hormonais. Gostaria de ter mais quadril, de ter os ombros mais finos, ter seios maiores e por ai afora.

Com grandes poderes nascem grandes responsabilidades, e Eu precisaria ser forte o suficiente pra lutar pela minha vida. As pedras no caminho se resumiram no tratamento ainda no masculino - quando você ainda está masculinizada - e na rejeição de parte da família. Nesses momentos Eu tinha que mostrar minha força e você só descobre que é forte, quando ser forte é a sua única escolha. Abri mão de muitas coisas, segurança, tratamento digno e humano, uma vida sem constrangimentos mas em troca ganhei milhares de outras, uma vida social, amigos, maturidade, felicidade.

Quando comecei a me sentir um pouco mais confiante, passei a sair para os meus compromissos sociais como mulher, afinal Eu estava nascendo e me descobrindo em cada passo, em cada ciclo de respiração, tudo era novo e - continua - empolgante. Estava extremamente insegura em relação a tudo, não entrava em locais onde não havia estado antes, não entrava em locais com muita gente, não andava por ruas movimentadas, estava exalando insegurança.

Com o passar do tempo, comecei a ganhar confiança e a me sentir mais segura, já não estava mais tão preocupada com os outros e suas reações e sim com a minha vida e minha felicidade. Aquele friozinho na barriga toda vez que me expunha fazia parte da minha rotina - ainda faz, em menor grau - e cada lugar novo que frequentava era uma barreira quebrada, um obstáculo a menos pra superar e a adrenalina de ter conseguido vencer mais um desafio era tamanha que acabava se transformando em um ótimo motivo pra enviar um monte de emails compartilhando a conquista e começar a visualizar o nascimento desse blog, como uma forma de extravasar o que mais tarde soube se tratar da mais pura felicidade que alguém pode sentir.

Ainda sinto esse friozinho na barriga, o que é bom, me faz sentir cada vez mais viva.